segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

A solução

Muita água rolou ainda naquela noite.

Não se chegava a nenhuma conclusão. Até que uma voz soou macia, trazendo como oferenda outra possibilidade ainda não pensada. Talvez agora fosse a hora de desfazer o impasse.

A voz era de Margarida, a responsável pela biblioteca. Ela, em geral, se mantinha calada nas reuniões. Mas nessa noite falou. Estava um tanto aflita com a inevitável exposição pública que o ato de falar exige:

_ Acho que Eleonora tem toda razão. Contudo não sabemos o que está guardado no cofre. Cada um tem uma idéia diferente. Nós já avançamos muito no tempo. Então acho que por isto ou por aquilo é melhor mantermos o cofre fechado. Lembram do sótão? Por que não colocamos o cofre fechado lá, enquanto não temos certeza de que queremos abri-lo.

_ Como ninguém lembrou antes? O sótão. Sim, Margarida apresentou uma saída que merece ser considerada, disse Laurindo. E, brincando completou: _ Não é a toa que você se dedica à biblioteca. Sabe que a palavra biblioteca apareceu na Grécia com o significado de cofre dos livros?

Eles se lembraram de um lugar inexplorado no Teatro da Colina que também quedava esquecido. Na verdade nem chegava a ser um sótão.

Havia no teto da biblioteca um disfarçado alçapão que dava acesso a um espaço morto, um cômodo tão diminuto, mas repleto de coisas velhas: latas de tinta, pedaços de madeira, resquícios da construção do Teatro. Ele fora mesmo pensado como um quartinho para guardar entulhos, velharias. Por que o cofre não poderia ficar ali recluso, em sua recusa de abrir-se, preservando nessa nova clausura, seus segredos? Sairia da cozinha, da vista de todos, e abriria espaço para a modernização que os novos tanto queriam.

Diante dessa descoberta a abertura do cofre foi adiada. Naquela noite se resolveu seu destino. Ninguém podia garantir se a hora de abri-lo havia chegado...

O cofre foi tirado da cozinha e levado para o pequenino sótão, onde permaneceu por um tempo indefinido. Até que um dia, ele e sótão, foram novamente esquecidos. E o cofre se tornou a cápsula do tempo de Extima.

Quando Extima estiver também completamente esquecida, e o Teatro da Colina não for mais que uma ruína, vestígios de lugar nenhum, por entre matos que se alastram dominando o teatro, o cofre cápsula ainda sobreviverá fechado, intocado, em meio a restos de cimento e pedra, a céu aberto.

Um dia ele será encontrado. Solto e flutuante no inapreensível tempo, e será resgatado por curiosos visitantes que o arrombarão, desvendando a força seus segredos, na esperança de encontrar evidências históricas que possam contar-lhes sobre a forma de viver dos antigos habitantes daquele remoto e estranho lugarejo.

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