segunda-feira, 17 de novembro de 2008

Por que o policial precisa negar o conhecimento que adquire na academia?

Desaprender a academia, negar o ensinamento para se manter vivo nas ruas. Essa é a crença que o policial sustenta. Assim tem inicio o processo de afastamento dos novos policiais dos valores que norteavam suas vidas e, a concomitante entrada na illusio do campo policial. Conta-me um policial:
“(...) um professor falou na academia de polícia, uma das poucas coisas que eu guardei: ‘procurem sempre se olhar no espelho e fazer um exame de consciência, tipo, o quanto eu tô distante de mim mesmo, quem eu fui quando entrei e no que eu tô me transformando’. Então acho que no meio dessa massa gelatinosa... tá arriscado você perder a tua identidade. Na polícia você começa a dar uma valoração certa ao que é errado. Começa a achar que você anda certo pro lado errado da vida, ou anda errado por lado certo da vida. Porque você tem acesso a um código, e a medida que aquilo vai acontecendo você começa achar que aquilo ali é uma coisa normal. Você já não se sensibiliza mais. É aquela coisa do errado que passa a ser verdadeiro”.
O envolvimento do policial com o desempenho de suas funções pode acarretar graves conseqüências para sua saúde mental. Quer dizer, quando o policial iniciante entra pra valer no jogo (que é o próprio campo onde trabalha), começa a perceber que não é possível compartilhar em casa o que vive na rua, muitas vezes para proteger a família das situações difíceis que não raro ele se vê envolvido.
Quanto mais intimidade adquire com o campo mais se distancia da família, e quanto mais fortemente esse processo se desenrola, mais venera a família. Colocando-a num lugar ideal, cada vez fala menos de seu trabalho em casa. Esse é o início de seu isolamento e de sua divisão subjetiva.
É comum relatos de policiais que passam semanas sem aparecer em casa. Algumas vezes forçados pela necessidade do serviço, outras, levados por motivos que eles mesmos desconhecem. Não se dão conta que passam a gostar de freqüentar os lugares que investigam; não se dão conta que começam a se envolver com atividades que deveriam reprimir.

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