quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Contradições da legalidade no estado moderno

Nas primeiras décadas de independência o Brasil iniciava sua tradição liberal. E, para romper com o passado colonial, sentia-se a necessidade de criar atributos básicos para o estado, tais como: legislação penal, instituições e procedimentos judiciais.
Os liberais, e mesmo os conservadores do período da independência, viam a polícia e os procedimentos judiciais existentes como relíquias antiquadas de uma era passada, como um legado da opressão colonial.
A polícia havia surgido no estado absolutista como um artefato administrativo natural, apartado da política partidária. Então, a partir desse momento de mudanças estruturais, passou a figurar como órgão público característico do estado moderno.
Vivia-se um dilema que refletia as contradições da ideologia liberal. Os líderes políticos desejavam livrar-se da tutela colonial e do absolutismo monárquico, mas reconheciam que rupturas na forma de dominação em que se baseava a sociedade poderiam trazer transtornos para seu próprio status.
Muitas vezes a polícia praticava atos para os quais não havia base legal, como a repressão à capoeira, por exemplo. E o mesmo aparato político, judicial e policial que prendia e punia fisicamente os capoeiras, favorecia a violação da lei que proibia o tráfico dos escravos. Esses fatos ilustram o enraizamento da ilegalidade consentida na cultura brasileira.
O que se poderia esperar senão o distanciamento que a população pobre se reservava em relação às normas que a elite desejava impor?
Em maio de 1821, logo após assumir a regência, dom Pedro deu o primeiro passo para regulamentar as práticas policiais e judiciais.
Ele decretou que ninguém poderia ser preso a não ser por mandado judicial ou em flagrante, que as acusações formais contra o detento deveriam ser feitas no prazo de 48 horas após a prisão, que ninguém seria encarcerado sem que fosse condenado em tribunal aberto, que não usariam grilhões nem correntes e que a tortura deixaria de ser usada como punição.
Mas duas semanas depois, ele votou atrás em sua decisão ao decretar uma lista de salvaguardas semelhantes às da Constituição liberal portuguesa.

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