quinta-feira, 26 de junho de 2008

Como a necessidade se exterioriza no significante

Quando o homem nasce ele existe sem linguagem, ele é infans (expressão latina que designa a criança como ser sem linguagem). O ser humano nasce prematuro e incompleto, absolutamente dependente de sua mãe, ou de outra pessoa. Exemplo único entre os mamíferos.
O bebê não articula suas necessidades, mas as exprime de modo desarticulado: grita e faz movimentos incontrolados. Sua mãe busca compreender, dar sentido a essas expressões, adivinhando de alguma maneira o que ele precisa ou quer, na tentativa de saciar suas necessidades.
Para ser compreendida por sua mãe, a criança aprendendo a falar deve exteriorizar sua necessidade no significante. Todavia, o significante é passado de boca em boca antes de poder servir à criança que dele precisa fazer uso para designar suas necessidades.
No Curso de lingüística geral preparado por Saussure, encontramos a seguinte passagem que atesta a precariedade do significante no que se refere a seu poder para encarnar a necessidade e mesmo o desejo.
Se, com relação à idéia que representa, o significante aparece como escolhido livremente, em compensação, com relação à comunidade lingüística que o emprega, não é livre: é imposto. Nunca se consulta a massa social nem o significante escolhido pela língua poderia ser substituído por outro. Este fato, que parece encerrar uma contradição, poderia ser chamado familiarmente de ‘a carta forçada’. Diz-se à língua: ‘Escolhe!’; mas acrescenta-se: ‘O signo será este, não outro’. Um indivíduo não somente seria incapaz, se quisesse, de modificar em algum ponto a escolha feita, como também a própria massa não pode exercer sua soberania sobre uma única palavra: está atada à língua tal qual é. (...) se se quiser demonstrar que a lei admitida numa coletividade é algo que se suporta e não uma regra livremente consentida, a língua é a que oferece a prova mais concludente disso (Saussure, F. 1995, p. 85).
O significante contém o sentido que os outros lhe deram e não precisamente aquele que a criança desejou dizer. Portanto, quando o sujeito se utiliza do ato da fala, ele o faz somente porque deseja dele se servir como um meio para enfim impor sua demanda. Esta seria a forma, agora tornada fala, como ele pode se aproximar de seu próprio sentir. A demanda seria assim o gritar e espernear do bebê, um pouco mais articulados.

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